Lilia Diniz
fotografada por Artur Gomes na 31ª Feira do Livro de Brasília
4.3
Trago a faca cega das palavras
e um alfabeto pobre
incapaz de traduzir
o gozo silencioso
que o teu misterioso
e alucinógeno olhar causa
ao penetrar minha pele,
provocando ebulição
no rio da minha alma.
Sigo no exercício cotidiano
de amordaçar com o éter da metáfora escrita
o pavor que tua ausência me causa.
Asfixio meu pensamento
e faço da poesia
monólogo de saudade
do teu corpo sobre o meu
4.4
Os moinhos de vento do teu peito
giram na direção oposta
da rota que insiste
aproximar nossas bocas.
Teus olhos me despem
com volúpia incendiária.
Empunhando a espada do silêncio
tua língua em brasa
devora meus lábios
com a fome dos mil dias.
Tua saliva queima minha pele
calcina meus ossos
gelando meu pensamento
no espaço entre os suspiros ejaculados
no vulcão do meu ventre em erupção.
LíliaDiniz
www.pelegrafia.blogspot.com
Brasília - num sábado de chuva - foto: Artur Gomes
poema contemporâneo
1
fazer o poema
contemporâneo,
verso de
pólvora,
e fazê-lo
livre
como se não
fosse verso, pois
não é
este que flagra
um perfil
quando aceso.
2
se contem
porâneo, que os
críticos futuros
o contem,
e lhe expli
quem o pli in
explicável
em que se implica,
pois o palito só
o é se fagulha
súbitos tigres
no escuro.
3
o presente é
menor que o passado
pois o passado é desde
e para sempre,
o presente é ainda
menor que o futuro
que não é ainda
único,
o presente cabe
na cabeça de
um palito
útil.
4
poema nem
palito o é a
pós o fósforo
reduzi-lo a car
vão retorcido,
é o que prova
a história
de qualquer sol
ícito palito
finito no escuro:
risque-o até ar
der nos dedos.
Marcelo Diniz
*
Publicado 2nd April por Marcelo Diniz em Mallarmagens
**
DAS DORES DE SANTA MARIA
a dor tem tantas formas de doer
mas ela dói mais quando se chora
por quem não sentirá mais nenhuma dor
a dor tem jeitos diferentes de doer:
dói no corpo daqueles que se solidarizam
com o infortúnio dos outros,
tem vezes que dói até mesmo na indiferença
daqueles que não estão nem aí pela dor que os cerca
porém, a dor da indiferença
é a mais doída de todas as dores
porque ela fica represada entre muros insensíveis
que um dia haverão de se romper
e então todas as dores doerão numa só dor
por isso a dor pelos meninos mortos em santa maria
dói em cada um de nós
como se também estivéssemos
transitando sem rumo pelo inferno
de fogo & fumaça & desespero
do qual tantos não conseguiram escapar
é uma dor muda, entalada dentro da gente
que alguns vão suportar em silêncio,
cruz a ser carregada feito culpa
pela inoperância das nossas leis...
mas o conforto para tantas lágrimas
há de vir das bocas que não se calarão
e das vozes que não se deixarão sufocar
em memória de tanta vida, tanta alegria
e de tantos sonhos que nos escaparam
naquela maldita nuvem de fumaça.
Ademir Antonio Bacca
www.ademirbacca.blogspot.com
Jiddu Saldanha
fotografado por Artur Gomes - no Congresso Brasileiro de Poesia
- Bento Gonçlaves-RS - outubro 2013
Come minha carne
e lembra de roer o osso
no fundo do cerne
deguste a cartilhagem
meu cérebro à mesa
é for de banquete
aos predadores da
civilização
me leva em teu bico
oh urubu macio
cante sua canção silenciosa
aos quatro ventos
não me deixe aqui
triste e só
dê a esse corpo
o direito de ser pó
Jiddu Saldanha
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