XVIII CONGRESSO BRASILEIRO DE POESIA

sexta-feira, 29 de novembro de 2013

poesia do brasil


Lau Siqueira - foto: Artur Gomes - na 31ª Feira do Livro de Brasília

conceito


não alongo
poemas

apenas curto

no máximo
s u r t o


Lau Siqueira
Poesia Sem Pele






noite vazia cala escura a mente que grita
vento abala resta o nada que sobra no tudo
cama me pesa pressa de calma em sono contido
prezo na reza peito espreita novo destino





água : milagre
que gira o rio
e a rosa 
dos ventos 
gira giram
os papéis 
sobre a mesa

jussara salazar



Bolero Blue

beber desse conhac
em tua boca
para matar a febre
nas entranhas
entre os dentes
indecente
é a forma que te como
bebo ou calo
e se não falo quando quero
na balada ou no bolero
não é por falta de desejo
é que a fome desse beijo
furta qualquer outra palavra presa
como caça indefesa
dentro da carne que não sai

Artur Gomes
www.pelegrafia.blogspot.com





Orfeu é Meu

Orfeu é meu
Ao som de jazz se fode mais

Espera que se atira da janela
Aos berros de gaitas que miam na Lapa
Nada flauta
Tudo se completa nela
E não há droga que imite o grito dessa hora
Nem lisérgico que se compare à vertigem do que vejo

Vejo
Que você não suporta o paraíso
Anda atrás do seu contato noutra boca
Tanta vontade pouca, fraco!
Queria ver gritar da minha janela
Eu te desafio: fica, grita, erra!
só confio em gente que berra

Vai de subversão convencional
Reclamando que a fila do inferno anda devagar
Pois trago notícias de lá:
Eles também tem céu
Igual ao da boca
Mas os ingressos estão esgotados
Ainda aceitam sangue
Mas tem que ser de si
E essa nota você não toca
Faltou cuidado com a gaita e com tudo que importa

Agora, os deuses festejam as feridas
Agulhas agudas tecem o fim
O solo do sim no fundo de mim
Ao som de jazz me leva aos céus
Enquanto sobes o morro em busca de Deus

Alice Souto
in Poesia Sustentável





aurora

dia desses, madrugada alta
insone, acordei a mulher
para matar saudades do adolescente
ébrio, na beira da praia, à espera do sol,
que buscava ouvir o mar chiando ao parir brasa

acompanhado, reconstituí a cena
tendo como elemento novo, além da mulher,
a barricada baixa de nuvens no final do horizonte
deflorada lentamente pelos dedos róseos do poeta

ela olhou e disse que as nuvens pareciam algodão doce
pensei e a mim lembraram ilha grande
que quando avistada da ilha seguinte
vê-se não ilha, mas continente;
imaginei após a amurada interna do forte
dos que querem manter como está
e já saem à guerra vencidos;
recordaram-me também a serra do imbé
fazendo fundos com a planície dos extintos 
lhe dando vértebras;
ou ainda a conseqüência do recife
no qual convergissem todas as ondas do atlântico
açoitando a pedra e espalhando espuma
como o cheiro do quarto no amor

o sol nasceu entre nuvens e metáforas
contemplei-o até a cegueira
beijei a mulher e me despedi de homero
que fez do ouro seu anel de noivado
e saiu comendo algodão doce



Aluysio Abreu Barbosa

atafona, 15/04/2000



quinta-feira, 28 de novembro de 2013

poetas do brasil





havia o vermelho
o amarelo claro
o azul claro –
azul de short de dormir
e todas as cores dançavam
e dançavam

e eram shorts
e eram cores
shorts com cores e
dançavam

somente o roxo não estava
porque o roxo é dos sonhos

Ana Dantas

Maceió-AL







por onde passeio minha língua
para Flavia D'Angelo

tenho ainda tuas unhas
mesmo não estando 
entre meus dedos
e no estado em que me encontro
mar é corpo palavra/carne
tua língua meu brinquedo

não creio amor sem isso
nem entanto aquilo outro
pouco entendo do espírito
mas o meu inda é de
porco

se nunca estive
agora estando
é que absinto não me cura

se o seguro porto
é que procura
pode tentar o outro lado
que o meu 

sou muito mais o lança/chama
pra incendiar os teus navios
muito além dos temporais
acender língua de fogo
como um danado cão vadio
farejando as altas ondas
deste terrível mar bravio

como se sabe ou como soube
amor não cabe em calmaria
em outro nome nunca coube
e nem atlântico caberia
quero beijar teu mar de buzios
e até teus seios comeria
ao mergulhar por entre as coxas
beber teu mel na maresia




Artur Gomes 












Um canto a Eros, ao anoitecer...

O amor é feito verso
quantum que corre
rio que não se sabe...

se para, fica, rima,
presilha
.... ou dispara

O amor diverso efeito

alarido
sussurro
algazarra

calmarias e zunido no peito,
quando ouvido é fibra atenta
rabicó e febre potente
dedo sal língua de gente

maresia, canto em mil disfarces
quando me enquadro com Eros,
controverso em pés silábicos
solto o peso e o espaço

leve o caminho, nos dedos 
pó poesia...
... o amor, a vida de teu abraço.



Carmen Silvia Presotto – Vidráguas!

A fotografia é de Ilona Pulkestene!







tem dias que o poema...


tem dias
que o poema
é um voo
que não leva
a lugar nenhum

© Ademir Antonio Bacca

Do livro: “Grito por dentro das palavras”
www.ademirbacca.blogspot.




preciso abraço amigo, 
fuga do mundo
olhar que me visto, 
carinho inteiro
de sobras não vivo,
amor dividido
no meio receios
carente menina
não supre mulher
desprezo desejo
fútil artificio
no sono escondo
palavra que falha
vivendo vazio
escondo o medo, 
carente implora
aplausos escusos
no meio de tudo
a sobra do nada
vieste pro mundo

Campos dos Goytacazes-RJ

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

mulheres poetas do Brasil




el castillo de loco


era onde ele dormia: isca noturna entre algumas traças e pulgas... e quando muito, ele que não dormia, estraçalhava tudo com as unhas; se dormia era entre os restos de rimas, urros e urina. 

e


dentro das xícaras matutinas, ele depositava o dia a dia, as suas caspas e as cinzas do cigarro de tabaco ... e seguia competindo com as baratas o asco do filtro [porque assim sentia melhor a nicotina], o seu desjejum, o seu resto de juízo e o alho, que era tudo o que ele mantinha na cozinha ...

e


enquanto ele observava o quadro de aviso-feltro "não alimente uma formiga", cerceava-lhe a rotina, entre os seus flagelos e as suas vertigens coloridas; retalhava o ácido do movimento externo da bengala, o cáustico entre as bexigas amarelas, e o lático das outras bolas de poligaláceas, as quais ele carregava junto a cadeira, ou na beira de seu chapéu que descansava-lhe a barriga... 



refletia sobre as maravilhas divinas e a luz demoníaca 


sua vida pelos olhos castanhos ... do amor...



Adriana Zapparoli








Um canto a Eros, ao anoitecer...


O amor é feito verso
quantum que corre
rio que não se sabe...

se para, fica, rima,
presilha
.... ou dispara

O amor diverso efeito

alarido
sussurro
algazarra

calmarias e zunido no peito,
quando ouvido é fibra atenta
rabicó e febre potente
dedo sal língua de gente

maresia, canto em mil disfarces
quando me enquadro com Eros,
controverso em pés silábicos
solto o peso e o espaço

leve o caminho, nos dedos 
pó poesia...
... o amor, a vida de teu abraço.



Carmen Silvia Presotto – Vidráguas!

A fotografia é de Ilona Pulkestene!








calo os monstros que assolaram entranhas num tempo que urgia de perigo o corpo. aborto contente pedaços doentes que não me cabem mais. renasço das trevas do espelho que chuta na face verdade oculta. mudo na força da pedra que cai de realidade vazia. fraca me julgo por me permitir assim. junto pedaços e me faço de novo a mulher que julgo ser...e serei.

Flávia D´Angelo

www.pelegrafia.blogspot.com



foto: Beatriz Bajo



ode às distâncias


I 
existe um mar dentro de um envelope sem remetente 
a tinta usada para a carta é opaca 
talvez escrita a lápis 
existe uma constelação de palavras sem significado 
aparente 
quem sabe ápis 
um tanto de saudade nos olhos de ressaca 
atravessados 

II 
existe um pé dentro de um galope sem acidente 
o tango traçado para o corpo empaca 
talvez uma cicatriz 
existe um coração descompassado 
saliente 
quem sabe aprendiz 
um tantã de samba gris na mão que aplaca 
inveterado 

III
existem países dentro de um xarope sem entorpecente 
o tinto bebido para o peito é faca 
talvez arranque a raiz 
existem línguas aladas sem agasalho 
frementes 
quem sabe fuzis 
um tasco de silêncio na tez que arrebata 
bordado




Beatriz Bajo







DESCRÉDITO

Se me perguntam:
— Escrever para TV, rende?
Respondo: — depende dos créditos
(aquelas letrinhas em que aparece o nome da gente
no começo ou no final, dependendo do canal).
A gente briga para tê-los,
para vê-los nas novelas, seriados
e acaba pirado
porque escritor não tem crédito
nem em Banco,
já que o saldo é sempre manco
e ninguém credita nada.
Ê profissãozinha desacreditada.


Leila Míccolis



homens/mulheres poetas do brasil

Hugo Pontes - Poços de Caldas-MG





Mês oito


há gosto pra tudo
dizem que até 
cachorro
alucina
no peito
saudade
é minha
sina...

Marisa Vieira 
(poema da série "Saudade")






A DOR DO PRETO ( Aos africanos escravizados) Marcia Mendes Lá na úmida senzala, Sentado na estreita sala, Junto ao braseiro, no chão, Entoa o escravo o seu canto, E ao cantar correm-lhe em pranto Saudades do seu torrão ...(Castro Alves, A Canção do Africano) Coragem infame. Saudade da terra que não conheceu. A dor do preto Cavalga a noite e Trabalha o dia. Marcas do açoite no corpo Alma cravejada de dor No âmago do ser A vida não vivida. Secreta boca do tempo Em vão o consome. A febre o agita no leito Ouve o relinchar da morte: Alimento e profecia. Treme o seu coração Leve a floração dos sonhos Dor sombria. Lábios balbuciam aos céus Sentimento fixo, sem rogativas. Olhos entretecidos, Mãos frágeis espalmadas Vida em degredo Trêmulos horrores. O negror da noite Marcou-lhe a pele. Na paisagem poeirenta, Tambores rasgam o silêncio do dia. Mulheres percebem A chegada do Anjo do sono. As vestes foram enfim abandonadas A dor do preto acabou, Hora de partir. Poço aberto, No porão os escombros. A morte é o cais da madrugada Que traz o perfume da vida A quem em vida Provou a raiz das trevas.

Marcia Mendes




A luz dele eu não sei se teria

Se acaso ontem eu
Tivesse ganhado
Um prêmio literário
E isso tivesse
Por uma manhã
Me deslumbrado
Teria sido passado
Na tarde, na praça
Quando meus olhos
Viram um cego
Errando a bengala
Na pedra.

Adriane Garcia






Chegada

Se tu viesses ver-me nessa noite
Encontraria na porta, um sorriso encanto
Um abraço envolvente como manto
Remédio que afugenta o açoite

Se tu viesses em passos lentos
Entalhando meu rosto em um camafeu
Ouviria todos os conselhos dos ventos
Vagalumeando ou brincando com o breu

Se tu viesses do horizonte belo
Galopando e seguindo o curso do rio
Pontilhando nosso elo nos rastros das estrelas
Escutaria o c
aminho que tanto te assobio...







do duro ofício

a
vida
tem
batido
as
minhas
emoções
com
 a
maestria
de
um
carpinteiro

prego
sobre
prego



cada
poeta
geme
a
sua
dor
com
o
verso
que
lhe
convém

Ademir Antonio Bacca
Poesia do Brasil – Vol. 17
Editora Grafite – XXI Congresso Brasileiro de Poesia
Bento Gonçalves – outubro 2013

Fernanda Dias na Oficina de Poesia Falada 
 e Produção de Vídeo em Pedra Dourada-MG

alguma poesia 


 não. não bastaria a poesia deste bonde
que despenca lua nos meus cílios
num trapézio de pingentes onde a lapa
carregada de pivetes nos seus arcos
ferindo a fria noite como um tapa
vai fazendo amor por entre os trilhos.
não. não bastaria a poesia cristalina
se rasgando o corpo estão muitas meninas
tentando a sorte em cada porta de metrô.
e nós poetas desvendando palavrinhas
vamos dançando uma vertigem
no tal circo voador.

não. não bastaria todo riso pelas praças
nem o amor que os pombos tecem pelos milhos
com os pardais despedaçando nas vidraças
e as mulheres cuidando dos seus filhos.

não bastaria delirar Copacabana
e esta coisa de sal que não me engana
a lua na carne navalhando um charme gay
e uma cheiro de fêmea no ar devorador
aparentando realismo hiper moderno,
num corpo de anjo que não foi meu deus quem fez
esse gosto de coisa do inferno
como provar do amor no posto seis
numa cósmica e profana poesia
entre as pedras e o mar do Arpoador
uma mistura de feitiço e fantasia
em altas ondas de mistérios que são vossos

não. não bastaria toda poesia
que eu trago em minha alma um tanto porca,
este postal com uma imagem meio Lorca:
um bondinho aterrizando lá na Urca
e esta cidade deitando água
em meus destroços
pois se o cristo redentor  deixasse a pedra
na certa nunca mais rezaria padre-nossos
e na certa só faria poesia com os meus ossos.

Artur Gomes
In Couro Cru & Carne Viva
Prêmio Internacional de Poesia - Quebec - Canadá 1987
fulinaimicamente – neste vídeo com imagens captadas durante a Rio + 20 tem o poema acima interpretado pelo seu autor – Artur Gomes





Tributo a Alberta Hunter

você cruzou o século vinte
longevalegremente
em estado de garça.
conheceu a injustiça,
o lodo, a lágrima,
como todos da nossa raça.
e no entanto você era o canto,
a essência do triunfo.
milênios de beleza
encontraram em sua voz
a vitalidade da fé –
africalegremente oculta
no élan dos ritos,
nas figas de marfim,
nas pérolas de búzios
e no blues.
você atravessou o século vinte
uivando para o céu
até a última letra da alegria,
a última sílaba
da palavra amor;
conheceu os porões da América
e seu coração atômico.

e no entanto você se integrou
ao ar real
se eternizando no cosmos
com a alma das flores e das pedras.

Salgado Maranhão
Do livro: A Cor da Palavra
Prêmio da Academia Brasileira de Letras - 2011


Aline de Oliveira na Oficina de Poesia e 
Produção de Vídeo em Sacramento - Manhuaçu-MG



fulinaimagem

1

por enquanto
vou te amar assim em segredo
como se o sagrado fosse
o maior dos pecados originais
e a minha língua fosse
só furor dos canibais
e essa lua mansa fosse faca
a afiar os verso que ainda não fiz
e as brigas de amor que nunca quis
mesmo quando o projeto
aponta outra direção embaixo do nariz
e é mais concreto
que a argamassa do abstrato

por enquanto
vou te amar assim admirando o teu retrato
pensando a minha idade
e o que trago da cidade
embaixo as solas dos sapatos

2

o que trago embaixo as solas dos sapatos
bagana acesa sobra o cigarro é sarro
dentro do carro
ainda ouço jimmi hendrix quando quero
dancei bolero sampleando rock and roll
pra colher lírios há que se por o pé na lama
a seda pura foto síntese do papel
tem flor de lótus nos bordéis copacabana
procuro um mix da guitarra de santana
com os espinhos da rosa de Noel

artur gomes
Poesia do Brasil - Vol. 15
Editora Grafite – XX Congresso Brasileiro de Poesia
Bento Gonçalves-RS – outubro 2012