XVIII CONGRESSO BRASILEIRO DE POESIA

sábado, 29 de dezembro de 2012

CONGRESSO BRASILEIRO DE POESIA EM LUTO


Com pesar comunicamos o falecimento da coordenadora do núcleo do Proyecto Cultural Sur de Porto Alegre e assessora da coordenação geral do Congresso Brasileiro de Poesia, MARIA CLARA SEGOBIA, ocorrido no final de tarde deste sábado, em Porto Alegre. Ela estava hospitalizada em tratamento de um câncer, diagnosticado no ano passado.


Maria Clara era uma das mais atuantes lideranças da poesia em todo o país e deixará uma lacuna insubstituível em nossos corações.






não sabemos 
quando não haverá 
mais futuro.
caso soubéssemos
teríamos aproveitado
melhor o presente

Maria Clara Segobia

Poesia do Brasil Vol. 15




Meus  três enigmas

Tenho pouco tempo
para resolver os três enigmas que me restam.
Os demais
ou não os resolvi
                                                        ou resolveram
me abandonar
                                  exaustos de mim.

São de  algum modo obedientes.
Só ganham vida
se os convoco.
Isto me dá a estranha sensação
que os controlo.
                              
                                  Complacentes
me olham
do canto de sua jaula.

Enigma que se preza
não se entrega
nem se apressa em estraçalhar
o outro com fúria da fera.

No entardecer
os três enigmas sobrantes
me espreitam soberanos.
Às vezes
mesmo arredios
aceitam meus afagos.
Na dúbia luz da madrugada
parecem desvendáveis.

O dia revém.
Eles me olham penalizados
E começam de novo a me devorar.

Affonso Romano de Saant´Anna




Mala de espera

Quando os céus forem gastos sapatos,
Postos sobre a usada mala de viagem,
Furados de astros, cometas, voragens,
Contemplarei a infância e calçarei os cautos

pés com estes céus tão lestos, gratos
e vagarei por trás de alguma aragem.
Nem se incham os pés nas siderais folhagens,
nem pisarão com solas nos regatos

das constelações. Amada, então posso
esbanjar o fulgor de ser criança.
E caminhar a noite, sem reparar o corso

da Via-Láctea, no seu carro que avança.
E calçarei os céus na luz exausta,
Até brotar o amor que nãos e acaba.

Carlos Nejar



Dois e dois são quatro

Como dois e dois são quatro
Sei que a vida vale a pena
Embora o pão seja caro
E a liberdade pequena

Como teus olhos são claros
E a tua pele, morena
Como é azul o oceano
E a lagoa, serena

Como um tempo de alegria
Por trás do terror que acena
E a noite carrega o dia
No seu colo de açucena

- sei que dois e dois são quatro
sei que a vida vale a pena
mesmo que o pão seja caro
e a liberdade pequena

Ferreira Gullar



Abrigo

agora esteio escora de pilar
penso propenso a desabar
quem dirá das estruturas
das paredes rachaduras
mentirá negará arquitetura
a fundação que já se afunda
dirá da fria pedra profunda
fundamental sob às vigas
quem dirá que agora diga
da profusão de estéticas
das linhas matemáticas
já tão curtas quase nulas
quem dirá já não regula
não há métrica no concreto
cair pode ser reto direto
deitar poderia ser o certo
morrer pode ser perto
mas me mantenho ereto
a cabeça sobre os ombros
há muito habito escombros

Rodrigo Mebs




fulinaimagem

1

por enquanto
vou te amar assim em segredo
como se o sagrado fosse
o maior dos pecados originais
e a minha língua fosse
só furor dos canibais
e essa lua mansa fosse faca
a afiar os verso que ainda não fiz
e as brigas de amor que nunca quis
mesmo quando o projeto
aponta outra direção embaixo do nariz
e é mais concreto
que a argamassa do abstrato

por enquanto
vou te amar assim admirando o teu retrato
pensando a minha idade
e o que trago da cidade
embaixo as solas dos sapatos

2

o que trago embaixo as solas dos sapatos
é fato
bagana acesa sobra o cigarro é sarro
dentro do carro
ainda ouço jimmi hendrix quando quero
dancei bolero sampleando rock and roll
pra colher lírios há que se por o pé na lama
a seda pura foto síntese do papel
tem flor de lótus nos bordéis copacabana
procuro um mix da guitarra de santana
com os espinhos da rosa de Noel

Artur Gomes



Alguns dos poema publicados na Antologia Poesia do Brasil – Vol 15- Proyecto Cultural Sur Brasil – Editora Grafiti – Congresso Brasileiro de Poesia – Bento Gonçalves-RS - 2012 - que será lançada no dia 22 de janeiro de 2013 na Livraria Argumento - Rua Dias Ferreira, 417 - Leblon - Rio de Janeiro


Poesia do Brasil Vol. 15





Entre ferro e fio

Como punhal
sem sangue
e sem ruído
a agulha vara a carne do tecido.
Ouvem-se apenas
do metal vencido
a queixa do dedal
e um leve sibilar
ferindo as fibras.
A linha se insinua
serpente que
entre trama e urdidura
de outros fios se defende
e ponto a ponto
impõe
nova estrutura.
A essa falsa fronteira
que sem ser cicatriz
o corte emenda escondida na beira
a essa semovente arquitetura
batizamos
costura.

Marina Colasanti



não se beija o morto
ao morto se agradece
pela vida
cerca de pedra
subitamente interrompida

não se lamenta o morto
do morto se registram
as virtudes
e os inúmeros vícios

não se culpa o morto
ao morto se perdoa
o que ficou nas entrelinhas
e os silêncios

não se julga o morto
do morto guarda-se
o último registro
carteira de identidade
um anel de pedras falsas

não se purga o morto
o morto é quadro
na parede das lembranças
saudade
que acontece em repentes

do morto não te despeças
o morto é tempo
que não se abandona

Sérgio Napp


Avesso

pode parecer promessa
mas eu sinto que você é  a pessoa
mais parecida comigo
que eu conheço
só que do lado do avesso

pode ser que seja engano
bobagem ou ilusão
de ter você na minha
mas acho que com você eu me esqueço
e em seguida eu aconteço

por isso deixo aqui meu endereço
se você me procurar
eu apareço
se você me encontrar
te reconheço

Alice Ruiz



labirinto

coração
que bate
fora
do peito
a poesia
tem vezes
que é labirinto
onde a palavra
não quer
ser encontrada

Ademir Antônio Bacca



Alguns dos poema publicados na Antologia Poesia do Brasil – Vol 15- Proyecto Cultural Sur Brasil – Editora Grafiti – Congresso Brasileiro de Poesia – Bento Gonçalves-RS - 2012 - que será lançada no dia 22 de janeiro de 2013 na Livraria Argumento - Rua Dias Ferreira, 417 - Leblon - Rio de Janeiro

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Lançamentos Congresso Brasileiro de Poesia


Rio da Memória




Aquele rio
Está na memória
Como um cão vivo
Dentro de uma sala.

João Cabral de Melo Neto

Diz a lenda que certa vez uma pomba,
atingida por um tiro, caiu
às margens de um rio e aí, depois
de perder várias penas, saltou
das mãos do caçador, ganhou as águas
do rio e como um cão sem plumas
escapuliu para sempre.

De Rio da Pomba, Rio Pomba se chamou,
e a contração perdeu-se no poema.
O poeta se aventura nesta saga
de arte-vida, de outros risos-mares
e de mares-riachos, segredo
que conhece muito bem.

Com verbo fino, raro, diz, re-diz,
mira, desvenda ou veda na espuma
de um tempo nunca dantes velejado.

Sua música tece o apuro de sons
limpos, cortes sibilinos para
olhos ágeis, a mão armando
um leque de metáforas: meta.
No entanto é simples seu fluir.

Sob o manto de rios-mares, entrelinhas
faíscam e o minerador-matreiro
ora afasta um galho na passagem
ora imprime força às escuna,
de onde rasantes voos restauram
da história a face e o verso
imerso em lâmina sagaz.

Riverrun: um filme ou barco
que se toma em qualquer ponto
e desse porto é círculo a leitura, quieta.

At the end, Rimbaud re(i)achado
descerra a cortina, enxuga a fonte,
e, ao interrogar o horizonte,
- fotos, arte, voz, meandros
Resultam na paisagem inflada cada
Take planejado: foto/cine/drama
Da cidade-mundo que o poeta ama.

Joaquim Branco
Texto-apresentação de Pomba Poema
(re)escrito para a orelha do livro
minas em mim e o mar esse trem azul
de Ronaldo Werneck